- 1
Fausto Bordalo Dias - Por Este Rio Acima
- 2
Fausto Bordalo Dias - Foi Por Ela
- 3
Fausto Bordalo Dias - Como Um Sonho Acordado
- 4
Fausto Bordalo Dias - Eu Cá Sou do Midi
- 5
Fausto Bordalo Dias - Já Foste Linda, Rosa!
- 6
Fausto Bordalo Dias - O Barco Vai De Saída
- 7
Fausto Bordalo Dias - A Ilha
- 8
Fausto Bordalo Dias - A Guerra É a Guerra
- 9
Fausto Bordalo Dias - Ao Longo de Um Claro Rio de Água Doce
- 10
Fausto Bordalo Dias - Atrás dos Tempos
- 11
Fausto Bordalo Dias - Navegar, Navegar
- 12
Fausto Bordalo Dias - Peregrinações
- 13
Fausto Bordalo Dias - A Chusma Salva-se Assim
- 14
Fausto Bordalo Dias - Não Canto Porque Sonho
- 15
Fausto Bordalo Dias - O Conquistador
- 16
Fausto Bordalo Dias - Oh Pastor Que Choras
- 17
Fausto Bordalo Dias - P'ró Que Der E Vier
- 18
Fausto Bordalo Dias - Porque Não Me Vês
- 19
Fausto Bordalo Dias - Se Tu Fores Ver o Mar (rosalinda)
- 20
Fausto Bordalo Dias - À Deriva Porto Rico
- 21
Fausto Bordalo Dias - A Flóber
- 22
Fausto Bordalo Dias - A Tua Presença
- 23
Fausto Bordalo Dias - Coça Barriga
- 24
Fausto Bordalo Dias - Comboio Malandro
- 25
Fausto Bordalo Dias - Corações Sentidos Corações
- 26
Fausto Bordalo Dias - Final
- 27
Fausto Bordalo Dias - Madrugada
- 28
Fausto Bordalo Dias - Mariana Das Sete Saias
- 29
Fausto Bordalo Dias - O Homem E A Burla
- 30
Fausto Bordalo Dias - O Mar
- 31
Fausto Bordalo Dias - P´ró Que Der e Vier
- 32
Fausto Bordalo Dias - Poema da farra
- 33
Fausto Bordalo Dias - Rosie
- 34
Fausto Bordalo Dias - Uma Cantiga De Desemprego
A Chusma Salva-se Assim
Fausto Bordalo Dias
A fazer fardos e trouxas
Arrombando porões
A roubar arcas e caixões
E abandonam as mulheres
Os filhos desamparados
Que choram muito assustados
Sem outra consolação
Que uns abraçados com outros
Incham das águas aos poucos
Dos tragos salgados da morte
Imploram a deus outra sorte
Às arfadas
Aos arrancos
Em prantos
E às golfadas
E uns se afogam de vez
Deixando-se ir ao fundo
E se entregam assim
Ao sono mais profundo
Outros gritam aos céus
Pela absolvição
E se enforcam depois
Com suas próprias mãos
Perneando com a morte
As pernas descarnadas
Feitas em rachas em lanhos
E tão estilhaçadas
Que por esta parte em destroços
Lhes vão caindo os tutanos dos ossos
E sem saberem nadar
Sem a nau
Sem tábua nem pau
Vai o mundo adornar
Cai ao mar
Cai ao mar
Daquela assada do barco
Constroem seu salvamento
Amarrou-se a gente ao troço
P´la cintura p´lo pescoço
Indo assim tão carregada
Ferem com facas e lanças
As mulheres as crianças
Que se aferram à jangada
Mas rezam avé-marias
Padre-nossos litanias
P´las almas dos mutilados
Que p´ra ali são abandonados
Às arfadas
Em arrancos
Em prantos
E às golfadas
Cheio vai o batel
E quase a afundar
P´ra alijarem a carga
Botam gente ao mar
Engole uma vez de vinho
E da marmelada um bocado
O pobre de um marinheiro
Mesmo antes de ser lançado
Deixou-se então atirar
Com os braços cruzados
E se ofereceu todo à morte
Tão quieto e calado
E o piloto logo abençoou
Os seus dois filhos
Que ele próprio lançou
E sem saberem nadar
Sem a nau
Sem a tábua nem pau
Vai o mundo a adornar
Cai ao mar
Cai ao mar
Pequena era a tua filha
E não a quiseram salvar
Ficou ao colo da ama
No barco grande a afundar
Suplicas da jangada
Enfim
Ergues teus braços de mãe
Mas não te escuta ninguém
A chusma salva-se assim
Gaspar ximenes
Calado
Não chores alto
Cuidado
Tu chora só no coração
Ou também vais como o teu irmão
Às arfadas
Aos arrancos
Em prantos
E às golfadas
Passam dias a fio
À pura fome e sede
E há quem vá tragando urina
E morra do que bebe
Outros da água salgada
Falecem dos sentidos
Gritando sempre por água
Lançam-se ao mar ressequidos
Vai-se o soldado e o china
Não fica dor nem mágoa
Botou-se estêvão mulato
Com a mesma sede de água
E na tarde daquela aridez
Atirou-se o padre
E o piloto outra vez
E sem saberem nadar
Sem a nau
Sem tábua nem pau
Vai o mundo a adornar
Cai ao mar
Cai ao mar